Lannes São Pedro

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Boletim de Ocorrência é necessário para dispensa por justa causa?

Uma pergunta que clientes empresariais costumam nos formular é se a dispensa por justa causa do empregado, especialmente por ato de improbidade ou mau procedimento, depende de prévio registro de boletim de ocorrência. Ou seja, caso o empregador identifique que o empregado praticou atos graves que importem em abrupta quebra de confiança, como por exemplo furto ou fraude, terá de registrar uma ocorrência policial para poder dispensá-lo?

A resposta é negativa. O registro de ocorrência na polícia serve apenas para comunicar à autoridade policial a suposta prática de crime. Trata-se apenas de uma narrativa unilateral e que está muito longe de se constituir em prova de qualquer fato. Nem mesmo o processo criminal depende dela para que tenha início. Nem o empregador precisa comprovar a prática de crime para dispensar o empregado. Quer dizer, ato de improbidade ou mau procedimento, não necessariamente precisam constituir crime para que esteja presente a possibilidade de extinção do contrato.

O importante para uma dispensa por justa causa obreira é que a empresa tenha provas sólidas do fato praticado pelo empregado que impede, no caso, a continuidade da relação de emprego. Não precisa comprovar a prática de crime, podendo (devendo), inclusive, evitar a sua prática (sob pena de responsabilização nos termos da Lei 12.846/13). Basta que identifique e comprove a prática do fato que, pela sua natureza, não condiga com o objeto da relação de emprego e que afete a relação de confiança entre as partes. A violação de um rigoroso código de ética, por exemplo, poderá respaldar uma dispensa motivada. Será seu o ônus de comprovar ao juízo trabalhista – caso haja processo discutindo a validade da dispensa – a existência desse fato, sob pena de se considerar a extinção do vínculo de emprego como imotivado (sem justa causa).

Importante também na dispensa por justa causa obreira que o empregador observe alguns requisitos legais. Para tanto, convém avaliar bem com sua assessoria jurídica se os fatos apurados e as provas colhidas podem ser utilizados para justificar uma dispensa nesses moldes. Analisar, por exemplo, se é proporcional a aplicação da penalidade em relação ao fato, ou mesmo se a penalidade não se mostra intempestiva. A desproporcionalidade da pena bem como sua intempestividade, podem comprometer a validade da dispensa.

Essa discussão acerca do boletim de ocorrência como meio de prova necessário a dispensa por justa causa não é comum no judiciário trabalhista. Alguns profissionais do direito ou mesmo alguns contadores costumam recomendar o registro confiando seja ele meio de prova dos fatos apontados para a dispensa, o que não é verdade e demanda cuidado.

Entre os poucos casos encontrados, interessante se mostra um do TRT de Minas Gerais (RO 0001022-08.2011.5.03.0032), em que justamente a empresa tentava respaldar a dispensa em registro de ocorrência. A Desembargadora relatora do caso, a Dra. Mônica Sette Lopes, disse que “o Boletim de Ocorrência também não legitima a dispensa. Ali somente consta o que foi dito aos policiais. A narrativa dos fatos revela desde logo certa inespecificidade quanto à autoria do fato imputado, ainda que a acusação tenha sido dirigida ao autor”. Nesse caso, o TRT converteu a dispensa do empregado por justa causa em dispensa imotivada por falta de provas.

Dispensar por justa causa o empregado não se trata, portanto, de uma tarefa fácil. Assim se tiver que respaldar uma dispensa motivada apenas com base em Boletim de Ocorrência sobre fatos que você não pode comprovar ao juiz trabalhista por outros meios, pense bem e se aconselhe com bons profissionais.

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